sábado, 31 de janeiro de 2009

A um Mascarado

Rasga esta máscara ótima de seda
E atira-a à arca ancestral dos palimpsestos...
É noite, e, à noite, a escândalos e incestos
É natural que o instinto humano aceda!

Sem que te arranquem da garganta queda
A interjeição danada dos protestos,
Hás de engolir, igual a um porco, os restos
Duma comida horrivelmente azeda!

A sucessão de hebdômadas medonhas
Reduzirá os mundos que tu sonhas
Ao microcosmos do ovo primitivo...

E tu mesmo, após a árdua e atra refrega,
Terá somente uma vontade cega
E uma tendência obscura de ser vivo!

Augusto dos Anjos

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Augusto dos Anjos (1884 - 1914)

Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos nasceu no Engenho Pau d'Arco, no município de Cruz do Espírito Santo, estado da Paraíba, no dia 20de Abril de 1884 tendo falecido a 12 de Novembro de 1914 em Leopoldina, vítima de pneumonia, embora se tenha tornado conhecida a história de que Augusto dos Anjos morreu de tuberculose, talvez porque esta doença seja bastante mencionada em seus poemas.
Foi um poeta brasileiro, identificado muitas vezes como simbolista ou parnasiano. Muitos críticos, concordam em situá-lo como pré-moderno. É conhecido como um dos poetas mais críticos do seu tempo, e até hoje sua obra é admirada tanto por leigos como por críticos literários.
Foi educado nas primeiras letras pelo pai e estudou no Liceu Paraibano, onde viria a ser professor em 1908. Precoce poeta brasileiro, compôs os primeiros versos aos 7 anos de idade. Em 1903, ingressou no curso de Direito na Faculdade de Direito do Recife, bacharelando-se em 1907. Em 1910 casa-se com Ester Filiado.
Dedicou-se ao magistério, transferindo-se para o Rio de Janeiro, onde foi professor em vários estabelecimentos de ensino. Faleceu aos 30 anos, em Leopoldina, Minas Gerais, onde era director de um grupo escolar.
Durante sua vida, publicou vários poemas em periódicos, o primeiro, Saudade, em 1900. Em 1912, publicou seu livro único de poemas, Eu. Após sua morte, seu amigo Órris Soares organizaria uma edição chamada Eu e Outras Poesias, incluindo poemas até então não publicados pelo autor. Um personagem constante nos seus poemas é um pé de tamarindo que ainda hoje existe em Engenho Pau d'Arco.
O seu amigo Órris Soares conta que Augusto dos Anjos costumava compor "de cabeça", enquanto gesticulava e pronunciava os versos de forma excêntrica, e só depois transcrevia o poema para o papel. De acordo com Eudes Barros, quando morava no Rio de Janeiro com a irmã, Augusto dos Anjos costumava compor no quintal da casa, em voz alta, o que fazia sua irmã pensar que era doido.
Sonetos de Augusto dos Anjos
Outras referências na internet:
Vida e obra de Augusto dos Anjos

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

És pedra

És pedra, altiva e senhora de ti,
Um alto rochedo, de frios sentimentos,
Em pé suportas todos os maus momentos,
Ao teu lado parece que não existi.

És rocha, muito dura e impenetrável,
Imóvel, observas-me daí com exaustão,
Eterna vives nessa grande solidão,
Ergues-te esguia, de forma inigualável.

Desgastas-te enganando a solidez,
A alma escondes na tua beleza,
Observas paciente o vaivém do mar.

Venero daqui essa tua robustez,
Sofro ao esbarrar nessa fortaleza,
Afasto-me para não mais me magoar.

2009 Vasco de Sousa
Os direitos da imagem pertencem ao seu autor.
O original pode ser encontrado aqui.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Ariana

Ela é o tipo perfeito da ariana,
Branca, nevada, púbere, mimosa,
A carne exuberante e capitosa
Trescala a essência que de si dimana.

As níveas pomas do candor da rosa,
Rendilhando-lhe o colo de sultana,
Emergem da camisa cetinosa
Entre as rendas sutis de filigrana.

Dorme talvez. Em flácido abandono
Lembra formosa no seu casto sono
A languidez dormente da indiana,

Enquanto o amante pálido, a seu lado
Medita, a fronte triste, o olhar velado
No Mistério da Carne Soberana

Augusto dos Anjos

Amor e Crença

E sê bendita!
H. Sienkiewicz

Sabes que é Deus?! Esse infinito e santo
Ser que preside e rege os outros seres,
Que os encantos e a força dos poderes
Reúne tudo em si, num só encanto?

Esse mistério eterno e sacrossanto,
Essa sublime adoração do crente,
Esse manto de amor doce e clemente
Que lava as dores e que enxuga o pranto?!

Ah! Se queres saber a sua grandeza,
Estende o teu olhar à Natureza,
Fita a cúp'la do Céu santa e infinita!

Deus é o templo do Bem. Na altura Imensa,
O amor é a hóstia que bendiz a Crença,
ama, pois, crê em Deus, e... sê bendita!

Augusto dos Anjos

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Vozes da morte

Agora, sim! Vamos morrer, reunidos,
Tamarindo de minha desventura,
Tu, com o envelhecimento da nervura,
Eu, com o envelhecimento dos tecidos!

Ah! Esta noite é a noite dos Vencidos!
E a podridão, meu velho! E essa futura
Ultrafatalidade de ossatura,
A que nos acharemos reduzidos!

Não morrerão, porém, tuas sementes!
E assim, para o Futuro, em diferentes
Florestas, vales, selvas, glebas, trilhos,

Na multiplicidade dos teus ramos,
Pelo muito que em vida nos amamos,
Depois da morte inda teremos filhos!

Augusto dos Anjos

Machado de Assis (1839 - 1908)

Joaquim Maria Machado de Assis nasceu no Rio de Janeiro a 21 de junho de 1839 tendo falecido na mesma cidade a 29 de setembro de 1908. O seu pai, um mulato de nome Francisco José de Assis era pintor de paredes e descendente de escravos, e a sua mãe, uma lavadeira açoriana (da Ilha de São Miguel) de nome Maria Leopoldina Machado.
Machado de Assis, canhoto, era um jovem de saúde frágil, epiléptico e gago. Ficou órfão de mãe muito cedo e também perdeu a irmã mais nova. Não frequentou a escola regular, mas, em 1851, com a morte do pai, a sua madrasta Maria Inês, à época morando no bairro em São Cristóvão, emprega-se como doceira num colégio do bairro, e Machadinho, como era chamado, torna-se vendedor de doces. No colégio tem contacto com professores e alunos é provável que tenha assistido às aulas enquanto não estava trabalhando.
Mesmo sem ter acesso a cursos regulares, empenhou-se em aprender tornando-se um dos maiores intelectuais do país, ainda muito jovem. Em São Cristóvão, conheceu a senhora Madamme Gallot, francesa e proprietária de uma padaria, cujo forneiro lhe deu as primeiras lições de francês, que Machado acabou por falar fluentemente. Também aprendeu inglês, chegando a traduzir poemas deste idioma, e posteriormente estudou alemão, sempre como autodidacta.
Foi poeta, romancista, dramaturgo, contista, jornalista e teatrólogo brasileiro, considerado como o maior nome da literatura brasileira, de forma maioritária entre os estudiosos da área. A sua extensa obra é composta por nove romances e nove peças teatrais, 200 contos, cinco colectâneas de poemas e sonetos, e mais de 600 crónicas. Machado de Assis assumiu cargos públicos ao longo de toda sua vida, passando pelo Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas, pelo Ministério do Comércio e pelo Ministério das Obras Públicas.
A obra ficcional de Machado de Assis tendia para o Romantismo na sua primeira fase, mas converteu-se em Realismo na segunda, na qual a sua vocação literária obteve a oportunidade de realizar a primeira narrativa fantástica e o primeiro romance realista brasileiro em Memórias Póstumas de Brás Cubas. Ainda na segunda fase, Machado produziu obras que mais tarde o colocariam como especialista na literatura em primeira pessoa (como em Dom Casmurro, onde o narrador da obra também é o seu protagonista). Como jornalista, além de repórter, utilizava os periódicos para a publicação de crónicas, nas quais demonstrava a sua visão social, comentando e criticando os costumes da sociedade da época, como também antevendo as mutações tecnológicas que aconteceriam no século XX, tornando-se uma das personalidades que mais popularizou o género no país.
Sonetos de Machado de Assis

Texto adaptado de um artigo da wikipédia.

domingo, 25 de janeiro de 2009

Gregório de Matos (1636 - 1696)

Gregório de Matos Guerra (1636-1696) nasce em Salvador, provavelmente em 1636. É filho de pai português (natural de Guimarães) e de mãe brasileira (Baiana).
Proveniente de uma família abastada, em 1642 estudou no Colégio dos Jesuítas, na Bahia. Em 1650 continua os seus estudos em Lisboa e, em 1652, na Universidade de Coimbra onde se forma em 1661. Em 1663 é nomeado juiz de fora de Alcácer do Sal.
Volta ao Brasil em 1682 e é nomeado tesoureiro-mor da Sé, na Bahia, depois de ordenado clérigo tonsurado – grau de iniciação nas ordens sacras que prevê a tonsura, corte de cabelo em formato de coroa típico dos prelados da época. Por se recusar a vestir batina, é destituído do posto em 1683. Passa a viver da advocacia e a escrever sua obra satírico-erótica, que retrata a sociedade baiana da época.
Os seus poemas, de forte inspiração clássica, denunciam a ganância e a busca do prazer pelos poderosos. Por isso, ganha o apelido de Boca do Inferno ou Boca de Brasa. Leva uma vida boémia até ser deportado para Angola, em 1694. Torna-se conselheiro do governador Henrique Jaques Magalhães na colónia portuguesa e, como compensação pelos serviços prestados, é autorizado a retornar ao Brasil, passando a viver no Recife, onde morre.
A sua poesia sobrevive graças a manuscritos apócrifos. É publicada pela primeira vez em 1831, numa coletânea organizada por Januário da Cunha Barbosa chamada Parnaso Brasileiro ou Colecção das Melhores Poesias dos Poetas do Brasil, Tanto Inéditas como Já Impressas.
Sonetos de Gregório de Matos

Publica os teus sonetos

Este blog está a partir de agora aberto a todos aqueles que desejem publicar os seus sonetos, de uma forma livre, para que este tipo de poesia seja divulgada de uma forma ampla.
Para quem o desejar fazer, basta enviar o soneto, que deverá ser original e feito pelo autor. Este será depois submetido a uma análise e se corresponder aos critérios do blog e aos temas abordados por aqui, então o mesmo será publicado.
Realço o facto de que o amor e a paixão são o tema central deste blog, embora não exclusivo.
Aguardo pela vossa partilha.
Peço o favor de enviar o texto, em formato Word, como anexo, para o endereço electrónico: osmeussonetos@gmail.com, devidamente identificados com a data de criação do mesmo e o nome do autor ou pseudónimo.

Boas poesias.
Vasco de Sousa.

sábado, 24 de janeiro de 2009

Análise de sonetos famosos

Após verificar que muitos dos utilizadores deste blog procuram encontrar análises que ajudem à interpretação de alguns dos grandes sonetos que aqui se encontram publicados (obviamente que não me estou a referir aos meus...), iniciei este tópico onde irei procurar incluir todas as análises que se vão encontrando por aqui e por ali, para que, quem procura, possa encontrar aquilo que deseja de uma forma mais rápida e fácil.
Devo acrescentar que não sou o responsável pelas análises efectuadas, e que me limitarei a recolher essa informação, atribuíndo os créditos a quem de direito.
Estas análises têm um fim meramente educativo, para que os leitores melhor possam compreender a poesia, no entanto, se algum dos autores não desejar que essa análise se encontre aqui publicada, basta deixar um comentário neste tópico, que eu a retirarei.
A todos aqueles que quiserem dar o seu contributo, para aumentar esta base de informações, agradeço desde já antecipadamente.

Análise de sonetos
Análise de Sonetos de Luís Vaz de Camões:
Análise de Sonetos de Vinicius de Moraes

Boas poesias.
Vasco de Sousa

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

William Shakespeare (1564 - 1616)

William Shakespeare nasceu em Stratford-upon-Avon a 23 de Abril de 1564 (não havendo certezas em relação a esta data) tendo falecido a 23 de Abril de 1616).
Foi um dramaturgo e poeta inglês, amplamente considerado como o maior dramaturgo da Língua inglesa.
As suas obras, que permaneceram ao longo dos tempos consistem em 38 peças, 154 sonetos, dois poemas de narrativa longa, e várias outras poesias.
As suas obras são mais actualizadas do que as de qualquer outro dramaturgo.
Muitos dos seus textos e temas, especialmente os de teatro, permaneceram actualizados até aos nossos dias, sendo revisitados com frequência pelo teatro, televisão, cinema e literatura.
Entre as suas obras é impossível não ressaltar o famoso Romeu e Julieta, que se tornou a história de amor por excelência e Hamlet, que possui uma das frases mais conhecidas da língua inglesa:
To be or not to be: that's the question (Ser ou não ser, eis a questão).
É certo que muito pouco se sabe sobre a vida de William Shakespeare.
Shakespeare nasceu e foi criado em Stratford-upon-Avon.
Aos 18 anos, segundo alguns estudiosos, casou-se com Anne Hathaway, que lhe concedeu três filhos: Susanna, e os gêmeros Hamnet e Judith Quiney.
Entre os anos 1585 e 1592, William começou uma carreira bem-sucedida em Londres como actor, dramaturgo e proprietário da companhia de teatro Lord Chamberlain's Men, mais tarde conhecida como King's Men.
Há especulações sobre sua sexualidade, sobre suas convicções religiosas, e sobre a autoria de suas peças, pois há especulativas que na realidade ele pode nunca ter existido, isto é, talvez suas obras tenham sido compostas por outras pessoas. Esta última especulação é extensa e tem diversas suposições, desde a de que esses autores assinavam como William Shakespeare, escondendo sua identidade, até a de que William Shakespeare foi provavelmente um actor passando-se como o autor das obras, que na verdade eram compostas por outros dramaturgos.

Produziu suas obras mais famosas entre 1590 e 1613.
As suas primeiras peças foram principalmente comédias e histórias, géneros do qual ele refinou com sofisticação. Em seguida, escreveu principalmente tragédias até 1608, incluindo Hamlet, Rei lear e Macbeth, considerados alguns dos melhores exemplos do idioma inglês.
Em sua última fase, escreveu tragicomédias e colaborou com outros dramaturgos.
Shakespeare era um respeitado poeta e dramaturgo em sua época, mas sua reputação só chegou ao nível em que está hoje a partir do século 19.
O Romantismo, em particular, aclamou a genialidade de Shakespeare.
A maioria das informações que se fazem acerca de William Shakespeare são meras especulações derivadas de estudos, leituras, interpretações, pontos de vistas, hipóteses, lógicas.
A única coisa que se tem certeza absoluta é que as peças atribuídas a Shakespeare marcaram praticamente todos os séculos seguintes, começando pelo tempo em que viveu.
Publicado em 1609, a obra Sonetos foi o último trabalho publicado de Shakespeare sem fins dramáticos. Os estudiosos não estão certos de quando cada um dos 154 sonetos da obra foram compostos, mas evidências sugerem que Shakespeare as escreveu durante toda sua carreira para leitores particulares.
Para consultar os seus sonetos, em versão original - clique aqui

Ainda fica incerto se estes números todos representam pessoas reais, ou se abordam a vida particular de Shakespeare, embora Wordsworth acredite que os sonetos abriram suas emoções.
A edição de 1609 foi dedicada a "Mr. WH", creditado como o único procriados dos poemas. Não se sabe se isso foi escrito por Shakespeare ou pelo seu editor Thomas Thorpe, cuja sigla aparece no pé da página da dedicação; nem se sabe quem foi Mr. WH, apesar de inúmeras teorias terem surgido a respeito.

Os críticos elogiam os sonetos e comentam que são uma profunda meditação sobre a natureza do amor, a paixão sexual, a procriação, a morte e o tempo.


Sonetos (traduzidos) de William Shakespeare


Soneto 1 (tradução de Jorge Wanderley) (ver original)

Soneto 15 (tradução) (ver original)

Soneto 17 (tradução) (ver original)

Soneto 23 (tradução) (ver original)

Soneto 29 (tradução Vasco Graça Moura) (ver original)

Soneto 30 (tradução) (ver original)

Soneto 38 (tradução) (ver original)

Soneto 53 (tradução) (ver original)

Soneto 71 (tradução) (ver original)

Soneto 73 (tradução) (ver original)

Soneto 91 (tradução) (ver original)

Soneto 92 (tradução) (ver original)

Soneto 116 (tradução de Barbara Heliodora) (ver original)

Soneto 148 (tradução) (ver original)

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Revolta

Certos dias em que a revolta me possui,
Num mundo, que ao contrário está virado,
Um louco Homem, pouco são e tresloucado,
Para mim a energia negativa flui.

Gostaria de fugir lá bem para longe,
Para um lugar que fosse só e apenas meu,
Tal como se esconde no convento o monge,
Longe deste falso e cínico apogeu.

Apetece-me gritar ! De raiva espumar !
Feroz lutar, contra toda a injustiça,
Para dignificar esta sociedade !

Com a podridão dessa alta classe acabar,
Derrubar com ardor a verdade postiça,
Estamos perdidos, em grande insanidade…

2009 Vasco de Sousa

Os direitos da imagem pertencem ao seu autor.
O original foi encontrado aqui.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Sonetos de Florbela Espanca (1894 - 1930)

Foi uma poetisa portuguesa, natural de Vila Viçosa (Alentejo), onde nasceu em 1894, filha ilegítima de João Maria Espanca e de Antónia da Conceição Lobo, sua empregada como criada de servir (como se dizia na época).

Morreu com apenas 36 anos, no dia do seu aniversário, a 8 de Dezembro de 1930. Tendo a sua mãe falecido em 1908, e apesar de registada como filha de pai incógnito, foi educada pelo pai e pela madrasta, Mariana Espanca, em Vila Viçosa, tal como seu irmão de sangue, Apeles Espanca, nascido em 1897 e registado da mesma maneira.


Note-se como curiosidade que o pai, que sempre a acompanhou, só 19 anos após a morte da poetisa, por altura da inauguração do seu busto, em Évora, e por insistência de um grupo de florbelianos, a perfilhou.
Estudou no liceu de Évora, mas só depois do seu casamento (1913) com Alberto Moutinho concluiu, em 1917, a secção de Letras do Curso dos Liceus. Em Outubro desse mesmo ano matriculou-se na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, que passou a frequentar.
Na capital, contactou com outros poetas da época e com o grupo de mulheres escritoras que então procurava impor-se.
Colaborou em jornais e revistas, entre os quais o Portugal Feminino.
Em 1919, quando frequentava o terceiro ano de Direito, publicou a sua primeira obra poética, Livro de Mágoas.
Em 1921, divorciou-se de Alberto Moutinho, de quem vivia separada havia alguns anos, e voltou a casar, no Porto, com o oficial de artilharia António Guimarães. Nesse ano também o seu pai se divorciou, para casar, no ano seguinte, com Henriqueta Almeida.
Em 1923, publicou o Livro de Sóror Saudade.
Em 1925, Florbela casou-se, pela terceira vez, com o médico Mário Laje, em Matosinhos. Os casamentos falhados, assim como as desilusões amorosas, em geral, e a morte do irmão, Apeles Espanca (a quem Florbela estava ligada por fortes laços afectivos), num acidente com o avião que tripulava sobre o rio Tejo, em 1927, marcaram profundamente a sua vida e obra.
Em Dezembro de 1930, agravados os problemas de saúde, sobretudo de ordem psicológica, Florbela morreu em Matosinhos, tendo sido apresentada como causa da morte, oficialmente, um «edema pulmonar».
Postumamente foram publicadas as obras:
Charneca em Flor (1930),
Cartas de Florbela Espanca, por Guido Battelli (1930),
Juvenília (1930),
As Marcas do Destino (1931, contos),
Cartas de Florbela Espanca, por Azinhal Botelho e José Emídio Amaro (1949) e
Diário do Último Ano Seguido De Um Poema Sem Título, com prefácio de Natália Correia (1981). O livro de contos Dominó Preto ou Dominó Negro, várias vezes anunciado (1931, 1967), seria publicado em 1982.
A poesia de Florbela caracteriza-se pela recorrência dos temas do sofrimento, da solidão, do desencanto, aliados a uma imensa ternura e a um desejo de felicidade e plenitude que só poderão ser alcançados no absoluto, no infinito.
A veemência passional da sua linguagem, marcadamente pessoal, centrada nas suas próprias frustrações e anseios, é de um sensualismo muitas vezes erótico. Simultaneamente, a paisagem da charneca alentejana está presente em muitas das suas imagens e poemas, transbordando a convulsão interior da poetisa para a natureza. Florbela Espanca não se ligou claramente a qualquer movimento literário. Está mais perto do neo-romantismo e de certos poetas de fim-de-século, portugueses e estrangeiros, que da revolução dos modernistas, a que foi alheia. Pelo carácter confessional, sentimental, da sua poesia, segue a linha de António Nobre, facto reconhecido pela poetisa. Por outro lado, a técnica do soneto, que a celebrizou, é, sobretudo, influência de Antero de Quental e, mais longinquamente, de Camões. Poetisa de excessos, cultivou exacerbadamente a paixão, com voz marcadamente feminina (em que alguns críticos encontram dom-joanismo no feminino). A sua poesia, mesmo pecando por vezes por algum convencionalismo, tem suscitado interesse contínuo de leitores e investigadores. É tida como a grande figura feminina das primeiras décadas da literatura portuguesa do século XX.
Sonetos de Florbela Espanca
Por ordem alfafética:

?
?!
À Guerra
À janela de Garcia de Resende
À morte
Às mães de Portugal
Árvores do Alentejo
A Anto !
A esta hora ...
A flor do sonho
Canção grata
Carta para longe
Chopin
Deixai entrar a Morte
Desdém
Divino instante
Doce certeza
Doce milagre
Duas quadras
Escrava
Escreve-Me
Escuta...
Hora que passa
Humildade
IX
Junquilhos ...
Lágrimas ocultas
Languidez
Mistério D`Amor
Nunca mais!
O espectro
Súplica
Triste passeio
Vão Orgulho

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Sonetos de Luís Vaz de Camões (1524 - 1580)


Não é bem certa a data do seu nascimento, mas apontam-se como datas prováveis 1524 ou 1525, talvez em Lisboa ou em Coimbra, na altura em que morria Vasco da Gama (1524). Foram seus pais Simão Vaz de Camões, segundo neto do trovador galego Vasco Pires de Camões, e D. Ana de Sá e Macedo, da família dos Gamas do Algarve.

É frequentemente considerado como o maior poeta de língua portuguesa e um dos maiores da Humanidade. O seu génio é comparável ao de Virgílio, Dante, Cervantes ou Shakespeare. Das suas obras, a epopéia Os Lusíadas é a mais significativa.
Entre 1542 e 1545, viveu em Lisboa, trocando os estudos pelo ambiente da corte de D. João III, conquistando fama de poeta e feitio altivo.


A sua formação académica decorreu provavelmente em Coimbra, onde o seu tio D. Bento de Camões era Chanceler da Universidade. Camões refere-se a ele na canção «Vão as serenas águas...». Não há registos da sua passagem por Coimbra.

Em 1548 é desterrado no Ribatejo. Em 1549 embarca para Ceuta onde perde o olho direito numa escaramuça contra os Mouros, ocorrência que relata na canção «Vinde cá, meu tão certo secretário...».
De regresso a Lisboa (1551), não tarda em retomar a vida boémia. São-lhe atribuídos vários amores, não só por damas da corte mas até pela própria irmã do Rei D. Manuel I. Teria caído em desgraça, a ponto de ser desterrado para Constância. Não há, porém, o menor fundamento documental de que tal fato tenha ocorrido. No dia de Corpus Christi de 1552 entra em rixa, e fere um certo Gonçalo Borges, funcionário da Cavalariça Real, sendo preso. É libertado por carta régia de perdão de 7 de Março de 1553, embarcando para a Índia na armada de Fernão Álvares Cabral, a 24 desse mesmo mês.

Depois Camões fixa-se em Goa onde escreveu grande parte da sua obra épica. Considerou a cidade como uma madrasta de todos os homens honestos. Lá estudou os costumes de cristãos e hindus, e a geografia e a história locais. Toma parte em mais expedições militares.

Em 1556 parte para Macau, onde continuou os seus escritos. Vive numa célebre gruta com o seu nome e por aí terá escrito boa parte d'Os Lusíadas. Naufragou na foz do rio Mekong, onde conservou de forma heróica o manuscrito de Os Lusíadas então já adiantados (cf. Lus., X, 128). No naufrágio teria morrido a sua companheira chinesa Dinamene, celebrada em série de sonetos. É possível que datem igualmente dessa época ou tenham nascido dessa dolorosa experiência as redondilhas Sôbolos rios.

Regressa a Goa antes de Agosto de 1560 e pede a protecção do Vice-rei D. Constantino de Bragança num longo poema em oitavas. Aprisionado por dívidas, dirige súplicas em verso ao novo Vice-rei, D. Francisco Coutinho, Conde do Redondo, para ser liberto. Em 1568, vem para a ilha de Moçambique, onde, passados dois anos, Diogo do Couto o encontrou, como relata na sua obra, acrescentando que o poeta estava "tão pobre que vivia de amigos". (Década 8.ª da Ásia). Trabalhava então na revisão de Os Lusíadas e na composição de "um Parnaso de Luís de Camões, com poesia, filosofia e outras ciências", obra roubada. Diogo do Couto pagou-lhe o resto da viagem até Lisboa, onde Camões aportou em 1570.
Faleceu em Lisboa no dia 10 de Junho de 1580 e foi sepultado a expensas de um amigo.
O seu túmulo, que teria sido na cerca do Convento de Sant'Ana, em Lisboa, perdeu-se com o terramoto de 1755, pelo que se ignora o paradeiro dos restos mortais do poeta, que não está sepultado em nenhum dos dois túmulos oficiais que hoje lhe são dedicados – um no Mosteiro dos Jerónimos e outro no Panteão Nacional.

A sua obra situa-se entre o Classicismo e o Maneirismo. Alguns dos seus sonetos, como o conhecido Amor é fogo que arde sem se ver, pela ousada utilização dos paradoxos, prenunciam já o Barroco que se aproximava.

Links de interesse:
Os Lusíadas - Análise - Texto integral

Sonetos (e poemas) de Luís Vaz de Camões
(ver TODOS)
Por ordem alfabética:

A chaga que, Senhora, me fizestes
A D. Leonis Pereira
A D. Luís de Ataíde, Viso-Rei
A D. Simão da Silveira

A fermosura desta fresca serra
À morte de D. António de Noronha
A Morte, que da vida o nó desata
À romana Populónia perguntava

À sepultura de D. Fernando de Castro
À sepultura del-Rei D. João III
A ti, Senhor, a quem as sacras Musas

A violeta mais bela que amanhece
Ah! imiga cruel, que apartamento
Ah, Fortuna cruel! Ah, duros Fados
Ah, minha Dinamene assi deixaste
Alegres campos, verdes arvoredos

Alma gentil, que à firme Eternidade
Alma minha gentil, que te partiste
Amor é fogo que arde sem se ver
Amor, co a esperança já perdida
Amor, que o gesto humano n' alma escreve

Apartava-se Nise de Montano
Apolo e as nove Musas, discantando
Aquela fera humana que enriquece

Aquela que, de pura castidade
Aquela triste e leda madrugada
Aqueles claros olhos que chorando

Bem sei, Amor, que é certo o que receio
Busque Amor novas artes, novo engenho

Cá nesta Babilónia, donde mana
Cantando estava um dia bem seguro
Cara minha inimiga, em cuja mão
Chorai, Ninfas, os fados poderosos
Coitado, que em um tempo choro e rio
Com grandes esperanças já cantei
Com que voz chorarei meu triste fado
Com voz desordenada, sem sentido
Como fizeste, Pórcia, tal ferida?
Como podes, ó cego pecador
Como quando do mar tempestuoso
Contente vivi já, vendo-me isento
Conversação doméstica afeiçoa
Correm turvas as águas deste rio
Crecei, desejo meu, pois que a Ventura
Criou a Natureza damas belas

Dai-me üa lei, Senhora, de querer-vos
De frescas belvederes rodeadas
De quantas graças tinha, a Natureza
De tão divino acento e voz humana
De vós me aparto, ó vida! Em tal mudança
Debaixo desta pedra sepultada
Dece do Céu imenso, Deus benino

Deixando o doce fato e a cabana
Descalça vai para a fonte
Descalço e sem chapéu Apolo louro
Despois que quis Amor que eu só passasse
Despois que viu Cibele o corpo humano
Diana prateada, esclarecia
Ditosas almas, que ambas juntamente
Ditoso seja aquele que somente
Diversos dões reparte o Céu benino
Dizei, Senhora, da Beleza ideia
Doce contentamento já passado
Doce sonho, suave e soberano
Doces e claras águas do Mondego
Doces lembranças da passada glória
Dos Céus à terra dece a mor beleza
Dos ilustres antigos que deixaram

El vaso reluciente y cristalino
Em fermosa Leteia se confia
Em prisões baixas fui um tempo atado
Em um batel que com doce meneio
Endechas, a Bárbara escrava
En una selva al despuntar del dia
Enquanto Febo os montes acendia
Enquanto quis Fortuna que tivesse
Erros meus, má fortuna, amor ardente
Esforço grande, igual ao pensamento
Está o lascivo e doce passarinho
Está-se a Primavera trasladando
Este amor que vos tenho, limpo e puro
Eu cantarei de amor tão docemente
Eu cantei já, e agora vou chorando
Eu vivia de lágrimas isento

Ferido sem ter cura perecia
Fermosos olhos que na idade nossa
Fiou-se o coração, de muito isento
Foi já um tempo doce cousa amar
Fortuna em mi guardando seu direito

Grão tempo há já que soube da Ventura

Ilustre e dino ramo dos Meneses
Indo o triste pastor todo embebido

Já a saudosa Aurora destoucava
Já claro vejo bem, já bem conheço
Já não sinto, Senhora, os desenganos
Já tempo foi que meus olhos folgavam
Julga-me a gente toda por perdido

Leda serenidade deleitosa
Lembranças saudosas, se cuidais
Lembranças, que lembrais meu bem passado
Lindo e sutil trançado, que ficaste

Males, que contra mi vos conjurastes
Memória de meu bem, cortado em flores
Memórias ofendidas que um só dia
Moradoras gentis e delicadas
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades

Na desesperação já repousava
Na metade do Céu subido ardia
Na ribeira do Eufrates assentado
Náiades, vós, que os rios habitais
Não passes, caminhante! Quem me chama?
Não vás ao monte, Nise, com teu gado
Nem o tremendo estrépito da guerra

No mundo quis um tempo que se achasse
No mundo, poucos anos e cansados
No tempo que de Amor viver soía
Nos braços de um Silvano adormecendo
Num bosque que das Ninfas se habitava

Num jardim adornado de verdura
Num tão alto lugar, de tanto preço
Nunca em amor danou o atrevimento

O céu, a terra, o vento sossegado
O cisne, quando sente ser chegada
O culto divinal se celebrava
O dia em que eu nasci, morra e pereça
O filho de Latona esclarecido
O fogo que na branda cera ardia
Ó gloriosa cruz, ó vitorioso
O raio cristalino se estendia
O tempo acaba o ano, o mês e a hora
Oh! quão caro me custa o entender-te
Oh, como se me alonga, de ano em ano
Olhos fermosos, em quem quis Natura
Ondados fios de ouro reluzente
Onde acharei lugar tão apartado
Onde mereci eu tal pensamento
Orfeu enamorado que tañía
Ornou mui raro esforço ao grande Atlante
Os reinos e os impérios poderosos
Os vestidos Elisa revolvia

Para se namorar do que criou
Passo por meus trabalhos tão isento
Pede o desejo, Dama, que vos veja
Pelos extremos raros que mostrou
Pensamentos, que agora novamente
Pois meus olhos não cansam de chorar
Por cima destas águas, forte e firme
Por sua Ninfa, Céfalo deixava
Porque a tamanhas penas se oferece
Porque quereis, Senhora, que ofereça
Posto me tem fortuna em tal estado
Presença bela, angélica figura
Pues lágrimas tratáis, mis ojos tristes

Qual tem a borboleta por costume
Quando a suprema dor muito me aperta
Quando cuido no tempo que, contente
Quando da bela vista e doce riso
Quando de minhas mágoas a comprida
Quando me quer enganar
Quando o Sol encoberto vai mostrando
Quando se vir com água o fogo arder
Quando vejo que meu destino ordena
Quando, Senhora, quis Amor que amasse
Quanta incerta esperança, quanto engano!
Quantas vezes do fuso se esquecia
Que gritos são os que ouço? – De tristeza
Que levas, cruel Morte? Um claro dia

Que me quereis, perpétuas saudades?
Que modo tão sutil da Natureza
Que pode já fazer minha ventura
Que poderei do mundo já querer
Quem diz que Amor é falso ou enganoso
Quem fosse acompanhando juntamente
Quem pode livre ser, gentil Senhora
Quem presumir, Senhora, de louvar-vos

Quem pudera julgar de vós, Senhora
Quem quiser ver d' Amor üa excelência
Quem vê, Senhora, claro e manifesto
Quem vos levou de mi, saudoso estado

Razão é já que minha confiança


Se a Fortuna inquieta e mal olhada
Se a ninguém tratais com desamor
Se algüa hora em vós a piedade
Se as penas com que Amor tão mal me trata
Se com desprezos, Ninfa, te parece
Se cuidasse que nesse peito isento
Se de vosso fermoso e lindo gesto

Se em mi, ó Alma, vive mais lembrança
Se lágrimas choradas de verdade
Se me vem tanta glória só de olhar-te
Se os capitães antigos colocados
Se pena por amar-vos se merece
Se tanta pena tenho merecida

Se tomar minha pena em penitência
Se, despois de esperança tão perdida
Seguia aquele fogo, que o guiava
Sempre a Razão vencida foi de Amor
Sempre, cruel Senhora, receei
Senhor João Lopes, o meu baixo estado
Senhora já dest' alma, perdoai
Senhora minha, se a Fortuna imiga
Senhora minha, se de pura inveja
Sentindo-se tomada a bela esposa
Sete anos de pastor Jacob servia
Suspiros inflamados, que cantais
Sustenta meu viver üa esperança

Tal mostra dá de si vossa figura
Tanto de meu estado me acho incerto
Todas as almas tristes se mostravam
Todo o animal da calma repousava
Tomava Daliana por vingança
Tomou-me vossa vista soberana
Tornai essa brancura à alva açucena
Transforma-se o amador na cousa amada

Üa admirável erva se conhece
Um mover de olhos, brando e piadoso


Vai-me gastando Amor e um pensamento
Vencido está de Amor meu pensamento
Verdade, Amor, Razão, Merecimento

Verdes são os campos
Vós outros, que buscais repouso certo

Vós que, de olhos suaves e serenos
Vossos olhos, Senhora, que competem



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