domingo, 11 de maio de 2008

Endechas a Bárbara escrava

Aquela cativa
Que me tem cativo,
Porque nela vivo
Já não quer que viva.
Eu nunca vi rosa
Em suaves molhos,
Que pera meus olhos
Fosse mais fermosa.

Nem no campo flores,
Nem no céu estrelas
Me parecem belas
Como os meus amores.
Rosto singular,
Olhos sossegados,
Pretos e cansados,
Mas não de matar.

U~a graça viva,
Que neles lhe mora,
Pera ser senhora
De quem é cativa.
Pretos os cabelos,
Onde o povo vão
Perde opinião
Que os louros são belos.

Pretidão de Amor,
Tão doce a figura,
Que a neve lhe jura
Que trocara a cor.
Leda mansidão,
Que o siso acompanha;
Bem parece estranha,
Mas bárbara não.

Presença serena
Que a tormenta amansa;
Nela, enfim, descansa
Toda a minha pena.
Esta é a cativa
Que me tem cativo;
E. pois nela vivo,
É força que viva.

Luís Vaz de Camões

1 comentários:

Anónimo disse...

BÁRBORA NÃO

Cantando o poeta em sua escora
levara na fadiga antiga vinha.
Ó moço que no leito discorres, cuida,
arde para que sinal torne tua amiga.
Contando que a viu em face distinta,
sua companheira sorriu somente.
Vai com ele na doce peia que mais não
pode viver se sabe. Amor, disse, e apôs
seu nome, sua ventura.
Então a doce morena mordeu o lábio,
mais rica, mais leve na canela.
Porte esguio que a alma aquece.
Com vagar sorriu, deitou olhar e
co’as mãos já humedecidas as escondeu.
“Fico grato, concretamente, de seu fastio
ou de seu intento.” Calou. Sorriu.
Sorriu somente.

José Maria de Aguiar Carreiro
Folha de Poesia, Junho de 2007
http://sol.sapo.pt/blogs/josecarreiro/archive/2007/06/10/camoes.aspx